João Volkmann no arrozal

A Fazenda Capão Alto das Criúvas fica no município de Sentinela do Sul, RS, a cerca de uma hora de Porto Alegre, na região conhecida como Arroio Velhaco. O proprietário da fazenda, João Volkmann, é um pioneiro na agricultura orgânica no Brasil e inspetor da certificadora IBD, de Botucatu, SP. Participante e trabalhador ativo de todas as etapas do processo de produção agrícola da Fazenda Capão Alto das Criúvas, ele demonstra o entusiasmo e a paixão pela terra. São pensamentos em relação às estrelas, às plantas, à enxada e a toda natureza.

PO – Quando você iniciou seu trabalho como agricultor agroecológico?

JW – Trabalho há dezessete anos com o cultivo ecológico. Sempre trabalhei unicamente com a agroecologia. Sou formado em agronomia e tomo conta deste terreno, que era de minha família e havia sido arrendado. Mas, atualmente, também dou aulas para médicos em Porto Alegre e em minha própria fazenda sobre o uso de plantas medicinais.

PO – Você é de origem alemã?

JW – Sou descendente de alemães. Cresci ouvindo Goethe e Schiller nas conversas de família. Muito do meu aprendizado devo ao conhecimento de meus antepassados.

“A biodinâmica é um projeto paisagístico.”

A Fazenda Capão Alto das Criúvas é rica em fauna e flora: nela vivem jacarés, capivaras, gaviões, garças, quero-quero. Em setembro, ganha beleza com os ipês amarelos. Existem araucárias, que ajudam na cura de verminoses animais e maricás, utilizados como insumos e sombreamento de plantas nativas. O crescimento da mata na fazenda é motivo de satisfação. “A biodinâmica é um projeto paisagístico”, diz Volkmann. O clima na região é inconstante. No dia de nossa visita fazia um sol forte mas choveu muito nos dois meses anteriores, atrapalhando a colheita do trigo. Foi um ano, também, prejudicado pelas geadas. Mas isso não foi o suficiente para uma expectativa de aumento na produção de arroz para o ano 2000. Esta é a cultura que ocupa a maior parte do terreno utilizado para plantio.


PO – Qual a variedade de culturas em sua fazenda e quanto você tem produzido anualmente?

JW – Em 1999, a produção foi de sete toneladas por hectare. Dos 567 hectares de fazenda, 120 são para plantio de arroz, quinze para cada uma das outras culturas, entre elas milho e soja, e 250 hectares de mato. Além de grãos na fazenda, há criação de bois, vacas e búfalos. Tudo orgânico. A venda pecuária ainda não está organizada mas certamente ocorrerá no futuro.

PO – Como você comercializa seu produto? E a exportação?

O arroz orgânico Volkmann tem os selos Demeter e IBD

JW – Alguns dos clientes da Fazenda Capão Alto das Criúvas são as empresas Agroparr, Nardelli e a cooperativa Coolmeia. Além disso, recentemente, criamos uma marca própria, a Volkmann, certificado pelo IBD e pela européia Demeter. Empresas da Alemanha, Inglaterra e Nova Zelândia são compradoras de arroz. Alguns imprevistos vêm atrapalhando um crescimento maior de minha marca, como o custo elevado para o transporte de pequenas cargas, que aumenta o valor final para o cliente. Além disso, o preço do arroz ficou em torno de U$6 para o ano 2000, longe dos U$16 de 1998 (apesar da diferença de câmbio), e abaixo da média histórica do arroz, U$10. Muitos agricultores irão à falência se o preço não começar a aumentar. A exportação também está aumentando mas temos problemas para envio de produtos para fora do país. Faltam informações mais claras para o produtor agrícola quanto ao procedimento para exportação. Infelizmente, o Governo Federal não apoia os produtores orgânicos em feiras no exterior, ao contrário do que acontece na Argentina.

PO – O consumidor brasileiro dá ao produto orgânico o seu devido valor?

JW – Acredito que o brasileiro tenha a cabeça mais aberta que o europeu para a aceitação dos produtos orgânicos no mercado. É preciso haver esclarecimento junto à população quanto a importância para a saúde de alimentos sem aditivos químicos. O interesse é recente e somente agora vem recebendo maior cuidado acadêmico. Os problemas para vendas estão nos preços altos, cerca de 30% mais caro que os alimentos convencionais. Mesmo assim está abaixando.

PO – Depois da colheita, onde você guarda o arroz? Que embalagem você utiliza para a venda do arroz Volkmann?

JW – A fazenda tem capacidade para armazenamento de 2000 toneladas de arroz e o silo para 750 toneladas. Há um controle para manter a temperatura baixa no silo para impedir o desenvolvimento de insetos. Quanto à embalagem para o arroz, o vidro seria a melhor opção, para o consumidor poder ver o produto; mas usamos o papel, que é mais barato e biodegradável. Jamais usaria plástico. Usamos na fazenda latas ao invés de balde de plástico.

PO – Como você prepara seus compostos orgânicos?

João Volkmann preparando composto orgânico em barril de madeira.

JW – As condições para o preparo são rigorosas. Deve ser feito num barril de madeira e a mistura envolve água e esterco colocado em chifre de búfalo, enterrado durante todo o inverno. Durante uma hora, a água com esterco tem que ser girada com força “até fazer um funil”, para depois rotacionar na direção oposta. Joga-se um pouco de extrato de flor de valeriana, trazida de Nuremberg, Alemanha, e que pretendo produzir na fazenda. Finalmente, distribuímos manualmente a mistura nas plantações de arroz.


O esterco tem muita energia em função do sistema ruminal do boi e o chifre segura toda essa força gasta pelo animal. O uso de chifres de búfalo, e não de boi, é inovador, tendo boa receptividade no último encontro de produtores biodinâmicos em Nuremberg, Alemanha. O barril de madeira foi adquirido em Bento Gonçalves, RS, numa das últimas fábricas do ramo no Brasil.

PO – Como é a sua relação com os agricultores que usam agrotóxicos? Qual sua posição quanto aos transgênicos?

JW – Faço parte de um pequeno grupo de encontro chamado CITE – Clube de Integração e Troca de Experiências, que envolve doze agricultores. A maioria não é orgânico. O grupo é aberto a todos os produtores agrícolas e ocorre uma vez por mês. Acredito que a maioria dos agricultores utiliza agrotóxicos por desconhecerem as vantagens do orgânico e suas técnicas de cultivo e criação. Quanto aos transgênicos, acredito que as empresas produtoras estejam tentando entrar no terceiro mundo de qualquer maneira, por terem sido barradas nos países desenvolvidos. Vamos torcer para que isso nunca aconteça.

PO – Fale um pouco mais sobre o pensamento agroecológico.

Detalhe do Arrozal com a mata ao fundo

JW – A agricultura orgânica é para fornecer alimentos e não para ganhar dinheiro. Deve ser atrelada à justiça social. Procuro repassar meus conhecimentos a todos os meus funcionários. Para mim, o ideal é a produção sem qualquer tipo de insumo ou máquinas tecnológicas. Planejo produzir no próximo ano um único hectare de arroz utilizando apenas carro de boi. Atualmente, tenho que utilizar tratores e outros recursos tecnológicos para suprir minha demanda.

Diante das muitas discussões sobre o conceito de orgânico, resolvi seguir um conselho de minha avó e olhar no dicionário o conceito da palavra. Foi uma experiência interessante…

Se o visitante do Planeta Orgânico ainda não seguiu o conselho da avó de João Volkmann, adiantamos a busca:

orgânico [do grego organikós, pelo latim organicu.] Adj. 1. Relativo à órgão, organização ou a seres organizados 2. Relativo a, o próprio do organismo 3. Arraigado profundamente 4. Que ataca os órgãos 5. Pertinente ou próprio dos compostos de carbono

fonte: Dicionário Aurélio

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