Clovis Guimarães Filho(1); José Nilton Moreira(2); Daniel Maia Nogueira(3)
1. INTRODUÇÃO
A valorização dos produtos caprinos e ovinos através da fixação de um padrão diferenciado de qualidade e de sua certificação é, no contexto atual de grande expansão da caprino e da ovinocultura em quase todas as regiões do país, a grande, senão única, alternativa estratégica capaz de assegurar a plena expressão do potencial dessas atividades no Semi-Árido e, ao mesmo tempo, de preservar os recursos da caatinga e promover o bem estar das populações que nela vivem e dela dependem (Guimarães Filho, 2005). A diferenciação dos produtos se dá a partir da incorporação aos mesmos de uma identidade territorial e cultural ligada estreitamente ao ambiente geográfico onde são produzidos
A idéia inicial é de trabalhar mais com o caprino que com o ovino, em função da maior facilidade de associação desta espécie com o bioma caatinga, responsável maior pelas suas especificidades. Outro fator favorável ao caprino diz respeito às maiores limitações de competitividade do ovino face a forte concorrência que se delineia com o crescimento exponencial da atividade, especialmente no Centro-Oeste e Sudeste. Há base para essa expansão. Apenas em São Paulo o déficit estimado é de 25 mil toneladas anuais de carne ovina (Fortes, 2004).
Somente a diferenciação dará condições de competitividade aos nossos produtos caprinos e ovinos. A criação de uma ou mais marcas de “cabrito” ou de “borrego da caatinga” com certificação de denominação de origem se fundamentaria nas relações do animal com o bioma, via um sistema produtivo utilizador de um mínimo de insumos externos e maximizador de tipicidades locais/regionais disseminados pelos distintos espaços do Semi-Árido.
A proposição exposta a seguir, como modelo preliminar para discussão, foi apresentada à Associação de Criadores de Caprinos e Ovinos de Petrolina e Região – ASCCOPER para a criação de um “cabrito do Vale do São Francisco”, entretanto pode servir de base, também, para a implementação de empreendimentos similares, envolvendo outros produtos caprinos e ovinos, que eventualmente possam surgir em outras espaços do Semi-Árido.
2. A CERTIFICAÇÃO DE DENOMINAÇÃO DE ORIGEM
A certificação de Denominação de Origem (DO) para o cabrito do Vale do São Francisco, deverá ser obtida mediante registro no Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, com base na legislação em vigor (atos normativos 134/97 e 143/98 e resolução 075/2000).
A DO é um tipo de certificação similar à existente em vários países, sobretudo na Europa. A certificação similar na França se chama AOC (Appellation d’Origine Contrôlée). Podem ser certificados com o selo DO todos os produtos cuja autenticidade e tipicidades se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos aí fatores naturais (solo, clima) e/ou humanos (tradição, cultura). É necessário que haja uma clara ligação estabelecida entre o produto, o território e o talento do homem (o “saber-fazer”). A DO constitui um poderoso instrumento de organização profissional do produtor rural, não sendo possível a utilização da sua marca por produtores de outras regiões.
A certificação de indicação geográfica, uma vez concedida é propriedade dos produtores. Além de implicar a melhoria acentuada do produto, estabelecendo sua diferenciação, agrega valor ao mesmo, facilita a inserção do produtor no mercado, protege o produto, fortalece as organizações dos produtores e, sobretudo, valoriza a região pela promoção e preservação da cultura e da identidade locais.
No país só existem dois produtos com selo de indicação geográfica: o vinho do Vale dos Vinhedos, RS e o café do Cerrado mineiro, este com base na região de Araguari. Outras iniciativas em busca dessa certificação estão em andamento, entre elas o mel de abelhas da região de São Raimundo Nonato-PI e os queijos do Serro e o da Serra da Canastra-MG. Com relação a caprinos e ovinos, no Brasil existe apenas uma experiência, ainda não certificada, com esse enfoque: o “cordeiro Herval Premium”, na região de Herval,-RS (Osório et al., 2005).
Na Europa, os produtos caprinos e ovinos com certificação de origem são inúmeros. Os exemplos mais conhecidos são o “borrego Serra da Estrela”, em Portugal, o “cordero Manchego”, na Espanha, e os queijos “roquefort”, de leite de ovelha, e “chabichou de Poitou”, de leite de cabra, na França.
Para obter o reconhecimento e utilizar o selo de denominação de origem em seu produto a associação, ou o grupo de associações, deve atender um conjunto de exigências entre elas a constituição de um conselho regulador e a elaboração de um manual de procedimentos, uma espécie de “manual de obrigações”, onde devem estar registrados todas as normas e procedimentos de produção a serem cumpridas pelos produtores. Antes, porém, é necessário que se defina as especificidades do produto a ser certificado, vinculando-as a uma ou mais características próprias daquele espaço e se delimite a zona de produção. O meio geográfico marca e personaliza o produto pelo que a delimitação da zona produtora torna-se pré-requisito indispensável. Outra alternativa de certificação para o cabrito do Vale seria o selo de Indicação de Procedência (IP), como a DO, um certificação com abordagem territorial, em que as exigências com relação à vinculação do produto com os fatores naturais e humanos são bem menores. Nesse caso, haveria a vantagem de se acelerar e simplificar o processo de concessão do selo.
3. CARACTERIZAÇÃO DO PRODUTO – O “CABRITO DO VALE”
A produção do cabrito do Vale deverá se processar em bases agroecológicas, utilizando genótipos baseados em raças ou ecotipos nativos, criados em um sistema semi-extensivo, caracterizado pelo pastejo na caatinga e pela complementação alimentar, nos períodos críticos, com pastos e forragens tolerantes a seca,
Quadro 1. Qualidades mercadológicas propostas para o Cabrito do Vale
QUALIDADES MERCADOLÓGICAS |
ESPECIFICIDADES |
Sanitária (saudabilidade) |
Uso mínimo de agro-químicos e rigoroso controle higiênico-sanitário na produção, processamento e distribuição (1) |
Nutritiva |
Baixos teores de gordura, colesterol e calorias, em relação aos demais tipos de carne |
Sensorial (organolépticas) |
Sabor característico associado ao pasto natural (“sabor da caatinga”), maciez e suculência |
De uso |
Apresentação em cortes especiais, resfriados ou congelados ou em carcaças inteiras |
Ambiental |
Forte identidade com os fatores naturais (solo, clima, vegetação, raças autóctones) e humanos (tradição, cultura) do meio geográfico Sertões do Sub-Médio São Francisco, onde é produzida em harmonia com o bioma caatinga |
(1) Sistema BPA (Boas Práticas Agropecuárias) ao nível de propriedade e sistema BPF (Boas Práticas de Fabricação), associado a inspeção SIF ou SIE, ao nível de abatedouro/unidades de processamento.
O “sabor da caatinga”, implícito na carne do cabrito, viria da associação dos genótipos nativos com a vegetação de caatinga, da qual se alimentam, pelo menos em parte de sua vida. Na realidade as qualidades da carne e da pele estão intrinsecamente associadas ao processo de seleção natural a que foram submetidos os caprinos trazidos pelos colonizadores a partir de 1535, permeado por longas caminhadas através da vegetação seca e espinhosa, intensa incidência solar, altas temperaturas, prolongados períodos de escassez de água e outros alimentos, acarretando uma alta rusticidade, sem perda de prolificidade, embora em detrimento da função leiteira e do porte. São, portanto, uma carne e uma pele construídos ao longo de 470 anos. Há necessidade, contudo, de um trabalho complementar da pesquisa para identificar e caracterizar em bases mais científicas essas e outras especificidades do produto vinculadas aos fatores naturais e humanos da zona de produção.
Quadro 2. Especificidades técnicas propostas para o produto
INDICADORES TÉCNICOS |
ÍNDICES EXIGIDOS |
Idade ao abate |
6 – 10 meses (dentes de leite) |
Peso vivo médio ao abate |
23 – 28 kg |
Peso da carcaça |
10 – 13 kg |
Condição corporal ao abate (escore) |
3,0 – 4,0 |
A seleção para o abate será feita com base na avaliação da condição corporal, (escores de 1 a 5, atribuído via palpação das apófises espinhosas e transversas, logo após a última costela), segundo Susin (1996).
As avaliações de carcaças ao nível de abatedouro, quanto ao grau de terminação (magra, gordura escassa, gordura mediana, gordura uniforme ou gordura excessiva) e quanto à sua conformação (convexa, subconvexa, retilínea, subcôncava, côncava ou destinadas à industrialização) serão realizadas de acordo com os métodos descritos por Osório & Osório (2001). Sua implementação contudo deverá ser deixada para uma segunda etapa do empreendimento. Os cortes comerciais da carcaça, a serem feitos nas unidades de beneficiamento, seguirão o sistema recomendado pela Universidade Federal de Lavras (Santos, 2002), cuja composição básica é representada pelo pescoço, braço anterior, paleta, lombo, costeleta, costela/fralda, perna e braço posterior.
As qualidades organolépticas, especialmente sabor, maciez e suculência, serão periodicamente monitoradas nos pontos de distribuição e de comercialização, inclusive com a aplicação eventual de painéis-teste de escala hedônica em amostras de consumidores (Madruga et al., 2002).
As peles
As peles produzidas deverão apresentar uma qualidade bem superior à média da região, em função do abate formal dos animais em abatedouro credenciados, eliminando já os defeitos de esfola, e em função do rigoroso manejo sanitário preconizado (controle de doenças parasitárias e infecciosas, especialmente a linfadenite caseosa). Os defeitos causados por contusões e ferimentos diversos serão minorados pela utilização de transporte em veículos adequados, que assegurem o bem-estar dos animais durante o transporte (separação física de lotes, eliminação de pontas de parafusos e bordas proeminentes). Os defeitos causados pelo uso de cercas de arame farpado (riscos, feridas e cicatrizes) deverão ser gradativamente reduzidos pela substituição, também gradativa, destas por cercas de arame liso.
4. DELIMITAÇÃO DA ÁREA DE PRODUÇÃO
A área geográfica natural proposta inicialmente para a produção do cabrito do Vale corresponde aos sertões pernambucano e baiano do Sub-Médio São Francisco, onde predominam as unidades de paisagem definidas no zoneamento agroecológico feito pela Embrapa, como Depressão Sertaneja e Superfície Cársticas. A área, visualizada na Figura 1, é formada pelas micro-regiões de Petrolina (municípios de Petrolina, Afrânio, Dormentes, Lagoa Grande, Santa Maria da Boa Vista e Orocó) e de Juazeiro (municípios de Juazeiro, Curaçá, Sobradinho, Casa Nova, Remanso e Sento Sé). Esta zona abrange uma superfície total de 54 mil km2, com uma população rural superior a 200 mil habitantes. Seus rebanhos caprino e ovino somam quase dois milhões de cabeças (60% de caprinos), correspondendo a aproximadamente 13% do rebanho nordestino.
O clima da área é quente, semi-árido, com média pluviométrica anual da ordem de 500 mm, irregularmente distribuídos Os solos apresentam em geral baixa fertilidade natural. Em função da baixa pluviosidade, a vegetação predominante é de caatinga hiperxerófila. Nela, as espécies arbustivo-arbóreas que constituem a dieta base dos caprinos, associadas, portanto, ao sabor característico da carne, são as seguintes: moleque-duro (Cordia leucocephala Moric); quebra-faca (Croton spp.); mororó (Bauhinia cheilanta Steud.); carqueja (Calliandra depauperata Benth); jurema-preta (Mimosa hostilis Benth); caatingueira (Caesalpina microphylla Mart.); pau-de-sete-cascas (Tabebuia spongiosa Rizzini); maniçoba (Manihot pseudo-glaziovii Pax et Hoffm.) e faveleira (Cnidoscolus phyllacanthus (Pohl.) Müell. Arg.).
O rio São Francisco, na forma do lago de Sobradinho, corta a região em sua metade oeste e a limita superiormente na sua metade leste, determinando um elevado potencial hídrico em suas áreas marginais. Nas áreas mais afastadas este potencial é muito baixo e agravado pelo acentuado teor de sais das águas subterrâneas. Nas áreas mais favoráveis desenvolve-se uma agricultura diversificada e rudimentar, de autoconsumo e/ou consumo local, associada à pecuária caprina/ovina. Nas áreas mais desfavoráveis predominam a caprino e a ovinocultura extensivas e ultra-extensivas. Nas áreas mais próximas ao rio, prevalece uma zona agrícola especializada, baseada no cultivo intensivo de frutas e hortaliças, onde a pecuária ainda não tem expressão.
5. O SISTEMA DE PRODUÇÃO PROPOSTO
O sistema produtivo proposto, apresentado de uma maneira sintética a seguir, é fundamentado nos trabalhos da Embrapa Semi-Árido, em Petrolina-PE, onde aprimora um modelo físico do sistema operado em escala operacional.
Genótipos
As raças autorizadas para a produção do cabrito do Vale são as raças nativas (Moxotó, Canindé, Repartida, Marota, Graúna, etc.), podendo ser utilizados animais mestiços, desde que mantida a predominância do sangue nativo, em proporção mínima ainda a ser definida.
Manejo alimentar do rebanho
A base alimentar das matrizes deve ser o pastejo e ramoneio em áreas de caatinga complementado, especialmente nos períodos secos, com algumas das seguintes alternativas:
- pastos diferidos (caatinga, capins buffel, corrente, gramão, etc.); forragem conservada (feno e/ou silagem de leucena, gliricídia, guandu, maniçoba); forrageiras para corte ou apanha (palma-forrageira, algaroba, melancia forrageira); palhadas e outros restolhos culturais;
- concentrados e subprodutos industriais isentos ou com baixo nível de químicos (farelos de algaroba, babaçu, licuri, raspas de mandioca); grãos (sorgo, milho e outros, cultivados segundo métodos agroecológicos); misturas múltiplas compostas de mescla de minerais com algumas espécies disponíveis na propriedade (folhas desidratadas de leguminosas nativas, de maniçoba, de leucena, de guandu; vagens de algaroba; grãos de sorgo; raspa de mandioca, entre outras)
As crias serão submetidas a um manejo alimentar, variável em função da época do ano, conforme alternativa a seguir: 0 a 20-30 dias – amamentação exclusiva junto às mães; 21-31 a 90-120 dias – amamentação controlada
(duas vezes ao dia) com acesso permanente a uma mistura múltipla com base nas alternativas indicadas acima e ao pastejo na caatinga, complementado com pastos cultivados de boa qualidade nos períodos secos e a partir de 91-121 dias – utilização das alternativas indicadas para as matrizes, combinadas em função da época do ano e da disponibilidade da oferta, podendo ser terminados em sistema de semi-confinamento.
Manejo dos pastos naturais e cultivados
Os pastos (tanto nativos quanto cultivados) deverão, sempre que possível, ser subdivididos para uso na forma rotacionada. Os cultivados deverão ser devidamente arborizados (nas formas de distribuição uniforme, bosquetes ou de faixas). A adubação utilizará preferencialmente fertilizantes de baixa solubilidade, privilegiando-se no sistema o aproveitamento da matéria orgânica produzida na propriedade (esterco na forma de composto e adubação verde a partir de leguminosas, como a leucena e a gliricídia, produzidas em cultivo consorciado), ou, numa primeira etapa, adquirida a terceiros. Outras práticas complementam o sistema, todas buscando privilegiar o solo como organismo vivo e dinâmico, o manejo ecológico de parasitos e doenças e a preservação da biodiversidade.
Manejo reprodutivo
O rebanho será, preferencialmente, submetido a um sistema de estações de monta, especialmente delineado para aquelas zonas produtoras responsáveis pela oferta de animais para abate nos períodos de entre-safra. Nas unidades produtivas mais tecnificadas as estações de monta poderão seguir o esquema de três estações anuais, sendo duas programadas e uma natural (coincidindo com o período chuvoso), permitindo a oferta de animais em diferentes épocas do ano. Cada estação programada terá a duração de 60 dias (a natural pode ser de 90 dias), sendo eliminadas as matrizes que não estejam prenhes por duas estações consecutivas ou que apresentem problemas de ordem física ou sanitária que afetem a sua fertilidade. As marrãs de reposição serão submetidas a uma primeira estação de monta de 90 dias e terão sua primeira cobertura com peso vivo mínimo em torno dos 25 kg.
Manejo sanitário
O sistema insere as boas práticas de produção de agropecuária (BPA) como estágio inicial de um plano de gestão , com controle de qualidade e certificação. As principais práticas abrangem vacinações contra clostridioses, controle de ecto e endoparasitoses (uso mínimo de vermífugos convencionais combinado a métodos não agressivos ao ambiente como a homeopatia, a fitoterapia e o descanso dos pastos). Outras medidas incluem a desinfecção periódica das instalações, quarentenário, pedilúvios, esterqueira, tratamento de umbigo, exames periódicos de artrite encefalite caprina (CAE) e medidas preventivas de controle da linfadenite caseosa.
O programa de produção
Visando manter a estabilidade na oferta do produto, buscar-se-á implantar um programa de produção capaz de fazer face ao atendimento das demandas do produto nas diferentes épocas do ano. Este programa de produção se fundamenta nos seguintes aspectos:
- Estabelecimento de um sistema de estações de monta com épocas diferenciadas entre as distintas zonas produtoras;
- Estratificação espacial da região em áreas de produção, com base no potencial de oferta estacional de forragem
- Integração com os perímetros irrigados visando reduzir os riscos de escassez de forragens que podem limitar ou comprometer a oferta de produto nas épocas de estiagens prolongadas.
A estratificação da região deve constituir um valioso instrumento técnico-gerencial para o empreendimento. O estabelecimento de zonas fornecedoras, de acordo com suas condições naturais de solo e vegetação, pluviosidade média, nível tecnológico empregado na atividade e infra-estrutura, assegurará, em função dessas características diferenciadas, um fluxo regular de matéria-prima, ao longo do ano, com menor dependência de restrições estacionais.
O sistema produtivo acima descrito é apenas uma referência, devendo ser adaptado às circunstâncias de cada unidade e de cada produtor. Não é flexível, contudo, no que concerne à exigência de raças nativas e de processos agroecológicos de cultivo e criação. Nesse sentido, o sistema procura contemplar as principais práticas de convivência com a seca e de preservação ambiental recomendadas pelas instituições de pesquisa, para zonas semi-áridas, sistematizadas no uso preferencial de recursos autóctones, de pastos cultivados tolerantes a seca, de métodos racionais de uso da vegetação nativa, de arborização dos pastos cultivados, de suplementação alimentar nos períodos secos com bancos de proteína/energia, de estabelecimento de reservas estratégicas alimentares para períodos de estiagem prolongada, de captação de água da chuva “in situ” nas áreas de cultivos forrageiros, de preservação de áreas de reservas legal e permanente, de uso maximizado de matéria orgânica e de adubos não sintéticos, de sistemas produtivos diversificados (interação com agricultura, extrativismo e outros subsistemas da propriedade, etc.) e de uso mínimo de insumos externos.
6. METAS COMPARADAS DE DESEMPENHO ZOOTÉCNICO
A utilização da vegetação da caatinga e de raças nativas são premissas básicas no processo produtivo do cabrito do Vale. Mesmo que esses fatores limitem um pouco a capacidade de um abate em idade mais precoce, isto não constitui problema maior, já que essa aparente desvantagem poderia ser neutralizada pela produção de carcaças mais leves ou largamente compensada, tanto por custos unitários de produção menores, quanto pelo maior valor agregado ao produto pelas suas especificidades mercadológicas. Carcaças mais leves têm também larga aceitação no mercado brasileiro. No exterior, um dos mais famosos cordeiros da Espanha, o “cordero Manchego”, com denominação de origem, é abatido aos 90 dias, com peso vivo de 22 a 28 kg e carcaça de 10 a 14 kg. Em outras palavras, o produtor do cabrito do Vale não teria maiores preocupações com comparações de ganhos-de-peso ou idade ao abate em relação às raças exóticas. A qualidade do produto teria uma maior relevância.
A diferença de desempenho não será tão grande. Em estudo conduzido por cinco anos na Embrapa Semi-Árido, caprinos do tipo comum, com forte predominância de genótipos nativos, foram submetidos a regime exclusivo de pastejo em caatinga, sob três diferentes lotações: um (alta), dois (média) e três (baixa) hectares por matriz. Todos os grupos foram sistematicamente vermifugados e tiveram acesso à uma suplementação mineral. O Quadro 3, a seguir, sintetiza os resultados observados.
Quadro 3. Desempenho produtivo e reprodutivo de caprinos nativos na caatinga sob diferentes taxas de lotação
PARÂMETROS |
LOTAÇÃO ALTA |
LOTAÇÃO |
LOTAÇÃO |
MÉDIA |
Número de crias nascidas/ME/ano |
0,97a |
1,15a |
1,41b |
1,17 |
Número de crias desmamadas/ME/ano |
0,58b |
0,76b |
1,03a |
0,79 |
Peso vivo ao desmame (kg) |
10,60a |
10,08a |
11,53a |
10,74 |
Quilogramas de crias desmamadas/ME/ano |
6,17b |
7,88b |
12,75a |
8,93 |
Quilogramas de crias desmamadas/hectare/ano |
6,17a |
3,92a |
4,23a |
4,77 |
Fonte: Guimarães Filho et al., 1988
Os valores observados podem parecer muito baixos, contudo, considerando a caatinga ter sido a única fonte alimentar, inclusive nos anos de chuvas bem abaixo da média (no terceiro ano foram apenas 277 mm), eles revelam uma capacidade de resposta muito forte na questão alimentar. Na lotação baixa foram observados valores anuais de até 1,81 cria nascida/ME/ano e de 12,9 kg de peso vivo ao desmame. Com o equacionamento da questão alimentar, bem como dos manejos sanitário e reprodutivo, como previsto nesta proposta, os resultados esperados tendem a confirmar os valores máximos observados nos dados experimentais, não muito distintos dos registrados, na prática, para os genótipos especializados e suas cruzas. O Quadro 4, a seguir, procura comparar o desempenho técnico esperado do cabrito do Vale com o desempenho médio observado nos sistemas convencionais extensivos, ainda predominantes no Vale do São Francisco.
Quadro 4. Desempenho técnico esperado para o Cabrito do Vale em relação ao sistema tradicional extensivo da região
INDICADORES |
CABRITO CONVENCIONAL (1) |
CABRITO ECOLÓGICO |
Crias nascidas/ME/ano (2) |
1,0-1,2 |
1,3-1,5 |
Crias desmamadas/ME/ano |
0,75-0,95 |
1,2-1,4 |
Mortalidade pré-desmame (%) |
20-25 |
5-10 |
Mortalidade pós-desmame (%) |
5-10 |
1-3 |
Unidades comercializadas/ME/ano |
0,7-0,9 |
1,1-1,3 |
Idade aos 28 kg peso vivo (meses) |
13-18 |
6-10 |
Peso vivo comercializável/ME/ano (kg) |
13-23 |
31-38 |
(1) sistema extensivo tradicional�
(2) ME = matriz exposta
7. O CONTROLE DA QUALIDADE DOS PRODUTOS
O Conselho Regulador
A certificação de origem a ser concedida pelo INPI implica, para sua manutenção, o estabelecimento de um eficiente sistema de controle interno de todos os processos envolvidos na produção, processamento e distribuição dos produtos. Será instituído um Conselho Regulador (CR), que terá entre suas tarefas a missão de zelar pelo cumprimento de todos os procedimentos previstos para tais processos, especificados no Manual de Procedimentos. O CR será uma entidade pequena, composta de técnicos especializados recrutados nas principais instituições públicas e privadas da região e de produtores associados indicados pela diretoria da ASCCOPER e das demais associações que venham a se incorporar ao projeto (Aprisco do Vale, de Santa Maria da Boa Vista, seria a principal parceira), todos voluntários. Caberá ao CR, através de inspeções periódicas às unidades produtoras, abatedouros e pontos de distribuição e comercialização, o monitoramento desses processos, implementando os ajustes e aplicando as medidas corretivas que se fizerem necessárias à preservação da qualidade dos produtos. Para isso, deverá manter um cadastro atualizado das unidades de produção e das unidades de processamento (abatedouros e unidades de beneficiamento).
Serão estabelecidas normas mínimas para o transporte dos animais da propriedade para a unidade central de termnação e para o abatedouro, buscando conciliar a necessidade de higiene, de segurança e de garantir injúrias mínimas aos animais (condenação da carne e depreciação da pele) com a economicidade. Para o transporte de carcaças, logo após o abate, deverão ser obedecidas as normas já em vigor, que exigem veículos especiais fechados.
O Manual de Procedimentos
O Manual de Procedimentos é um tipo de caderno de especificações ou de encargos, estabelecidos pelo CR, a que deverão se sujeitar os produtores associados da cooperativa para produzir o cabrito ecológico. Nele, além da caracterização completa do produto final a ser ofertado ao mercado, deverão estar definidas, de uma maneira didática, todas as condições exigidas para sua produção ao nível de campo e ao nível das unidades de processamento e armazenamento (abatedouros, frigoríficos, etc.).
O Manual abrange, portanto, a descrição completa do produto, a delimitação da área geográfica, as provas de origem exigidas, a descrição dos métodos de obtenção do produto (incluindo alimentação, genótipos, manejo reprodutivo e controle sanitário) e do sistema de controle qualidade. O cumprimento dessas normas e especificações é também eventualmente fiscalizado por empresas independentes credenciadas pelo INPI, com monitoramento contínuo de todo o processo pelo próprio conselho regulador da cooperativa.
O sistema de rastreabilidade
Como importante instrumento do sistema de gestão de qualidade, a rastreabilidade será priorizada no processo de produção do cabrito do Vale na busca de identificar os pontos de estrangulamento e proceder, em tempo oportuno, as ações corretivas que se fizerem necessárias. O objetivo é que todos os produtos dentro de um supermercado, de um açougue ou de um restaurante sejam conhecidos e controlados, bem como todas as unidades produtoras e transformadoras que enviam esses produtos.
A implantação do sistema será gradativa e os procedimentos procurarão, inicialmente, se basear naqueles estabelecidos pela União Européia, consideradas as naturais adaptações às nossas condições. O sistema identificará animais, carcaças e cortes em suas embalagens e configurações de transporte e estocagem, em todas etapas de produção e suprimento. O Quadro 5 sintetiza essas ações.
Quadro 5. Síntese das ações abrangidas pelo sistema de rastreabilidade
ETAPAS |
INSTRUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO |
INDICADORES |
Unidades produtivas associadas (convencionais, matrizeiros e terminadores) e unidade central de terminação |
Brinco com logotipo da associação, registro do produtor e numeração do cabrito |
Controle de conformidades |
Abatedouros credenciados e unidades de beneficiamento |
Etiqueta adesiva + marca indelével na carcaça |
Controle de conformidades |
Unidades de beneficiamento e pontos de venda |
Etiqueta adesiva + marca indelével nos cortes |
Inspeções de autenticidade do produto (etiquetas e marcas CV) |
(1) Cabrito do Vale
Um ponto fundamental exigido nesse processo é a formação de um banco de dados ao nível de propriedade. A implantação de registros zootécnicos e contábeis por parte do produtor integrado, mesmo que inicialmente simplificados e não informatizados, constituirá não apenas a fonte de dados básicos necessária ao sistema de rastreamento, mas, também, permitirá ao produtor proceder análises periódicas de eficiência zootécnica e econômica do seu empreendimento e identificar, com segurança, os pontos do sistema que necessitam prioritariamente de maior atenção.
A rastreabilidade é assegurada pelos métodos de identificação. A etiqueta de uma bandeja (com a logomarca do produto fornecida pelo CR) informa de que carcaça a carne foi obtida. A etiqueta da carcaça informa de que animal provém e o brinco desse animal informa de que rebanho (propriedade) procede. Os detalhes sobre a vida do animal deverão ser encontrados no banco de dados da propriedade.
Por sua complexidade e por implicar significativos custos adicionais, o sistema de rastreamento deverá ter uma implantação gradativa, visando sua consolidação em uma etapa posterior do empreendimento. Para se ter uma idéia da dificuldade de se implantar um sistema desse, o sistema Sisbov, montado para o rastreamento de bovinos destinados a exportação, criado em 2002, até hoje não se consolidou, passando atualmente por novas e profundas alterações (Franco, 2006).
8. ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO
Para as associações a estratégia mais recomendável, após definidos o produto e suas especificidades, seria iniciar o processo através de um projeto-piloto de produção e comercialização do cabrito ecológico, envolvendo um número limitado de associados. Validados os processos produtivo e organizativo e a aceitabilidade do produto pelo mercado, o modelo estaria apto para uma segunda etapa, de mudança de escala, expandindo-o para os demais associados e buscando novos mercados.
A certificação de Denominação de Origem credencia a organização como responsável pelo monitoramento regular da qualidade do produto e pelo atendimento às exigências de certificação. Para isso, a associação tem que estar formalmente constituída e possuir um sistema de controle interno (conselho regulador). O projeto-piloto deve incluir a formação de uma rede de articulação produtor-processador-distribuidor, incorporando, em um modelo de integração de pequena escala, as ações de financiamento, assistência técnica, promoção e comercialização do produto. As etapas de implantação do projeto compreenderiam especificamente:
Sensibilização e mobilização dos associados via palestras e reuniões, enfatizando-se nesse esforço o apoio de parceiros que já detenham essa certificação, visando, inclusive, possíveis ajustes nesta proposta;
Seleção, diagnóstico rápido e geo-referenciamento das unidades-piloto;
- Início das articulações para certificação do produto junto ao INPI – Articulação com outros parceiros comerciais (processadores, distribuidores e clientes diretos) e de apoio técnico e financeiro;
- Criação e capacitação de um CR, de controle interno do processo produtivo;
- Elaboração do manual de procedimentos técnicos (normas a serem atendidas na criação, processamento e comercialização, qualificação do produto);
- Capacitação técnica e gerencial dos produtores selecionados;
- Planejamento e implantação dos sistemas de produção nas unidades-piloto com o financiamento pelas fontes oficiais de crédito e/ou de acordos de cooperação com outros parceiros engajados direta (abatedores, distribuidores ou consumidores) ou indiretamente (Sebrae, Embrapa, etc.);
- Monitoramento e avaliação técnica, econômica e ambiental dos sistemas de produção implantados nas unidades-piloto pelo CR;
- Abate e processamento experimental da produção de cabritos oriundos das unidades selecionadas (abate, frigorificação, cortes especiais, formas de acondicionamento);
- Promoção e comercialização experimental do produto processado e certificado com clientes previamente articulados (redes de supermercado, programas governamentais, restaurantes e casas especializadas) e/ou em pontos de venda direta da associação.
O CR pode ainda monitorar e avaliar diversos parâmetros, entre eles o desempenho produtivo dos rebanhos, a capacidade de atendimento às normas de certificação, as qualidades mercadológicas dos produtos, além da economicidade do empreendimento e da aceitabilidade do produto pelo consumidor. Atendidos satisfatoriamente esses aspectos, o empreendimento estaria apto então para a fase seguinte, de mudança de escala, na qual seriam incorporados e capacitados novos caprinocultores associados e buscada a expansão do seu mercado.
A estratégia de lançamento do produto cabrito do Vale no mercado se baseará, ainda, em um plano de marketing a ser desenvolvido pela ASCCOPER e associadas, o qual procurará criar, desenvolver e fixar a imagem dessa linha de produtos junto aos consumidores. Esse plano deve começar com a escolha da marca, definindo-se por uma que se identifique com o produto e se adeqüe às embalagens, equipamentos de exposição e peças publicitárias a serem criadas.
9. O MODELO DE INTEGRAÇÃO
O modelo de integração, ilustrado no diagrama tentativo (Figura 2), terá por base uma cooperativa e será implementado de forma gradual. Ele implica uma perfeita articulação e entendimento formal entre a cooperativa e as diversas atividades da cadeia produtiva, representadas principalmente pela criação dos animais (produtor associado), o processamento (abatedouro, da própria cooperativa ou da prefeitura municipal) e a distribuição (também pela cooperativa), constituindo um modelo próximo ao concebido pelos produtores de ovinos da região de Brasília, apresentado no trabalho de Medeiros & Ribeiro (2006). A diferença é que neste modelo apresentado à ASCCOPER, parte do segmento de criação, o acabamento, poderá também ser operado pela cooperativa.
A idéia é que, em uma etapa posterior, muitos produtores associados comecem a se especializar como “matrizeiros” (fornecedores de crias desmamadas para terminação ou permanecer na forma tradicional que engloba a cria a recria e a terminação). O apoio tecnológico estará a cargo da Embrapa Semi-Árido, do Centro Regional de Tecnologia de Alimentos – SENAI-CERTA (implantação dos sistemas BPA e BPF) e do Centro Federal de Educação Tecnologia – CEFET (capacitação e assistência técnica dos produtores). Este apoio deve ser viabilizado, na prática, pelo apoio financeiro e institucional proporcionados pelo SEBRAE, Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e Banco do Brasil.
Os animais a serem abatidos serão selecionados ainda na unidade produtora, sob a supervisão do CR, com base nas exigências mínimas estabelecidas no Manual de Procedimentos. Os animais considerados prontos para o abate serão encaminhados diretamente para o abatedouro. Ao produtor integrado serão fornecidos regularmente os dados de peso e avaliação de carcaça dos animais fornecidos, planilhados por técnicos do CR.
Os cabritos poderão ainda ser selecionados na condição de semi-prontos ou desmamados, sendo então encaminhados para uma unidade central de terminação (semi-confinamento) da cooperativa, para concluir seu desenvolvimento até atingirem o peso de abate. Em uma etapa posterior é previsto, também, o surgimento de produtores associados especializados nessa prática (terminadores). No sistema proposto, o semi-confinamento de animais não prontos e desmamados constitui um apoio importante para aqueles produtores mais vulneráveis a períodos severos de seca e uma estratégia essencial para uma melhor padronização do mesmo à comercialização.
As unidades de beneficiamento (cortes, acondicionamento, rotulagem, armazenamento) poderão ser unidades localizadas no próprio abatedouro ou em unidades localizadas em pontos de comercialização direta da cooperativa ou dos demais compradores dos produtos (pequenas agroindústrias, supermercados, etc.).
Para fins de abate, todos deverão atender as exigências mínimas de qualidade estabelecidas, ou seja, peso vivo de 23 a 28 kg com idade máxima de 10 meses.
Os produtos intermediários (esterco, peles) serão comercializados na própria região, forte demandadora dos mesmos em função da presença da fruticultura de exportação e de dois grandes curtumes exportadores localizados em Juazeiro e Petrolina. Os produtos finais (cortes especiais, carcaças inteiras e vísceras, processados e acondicionados) gerados pelo modelo serão comercializados diretamente pela cooperativa junto aos mercados mais exigentes das capitais (classes A e B), embora não se possa descartar, para determinados produtos, a comercialização junto a compradores institucionais (governos federal, estaduais e municipais para programas sociais, merenda escolar, hospitais, etc.), pequenas agroindústrias, ou, numa etapa posterior, através de pontos de comercialização direta, estrategicamente localizados.
O modelo se complementa com o estabelecimento de um sistema de monitoramento, abrangendo a coleta de dados técnicos e econômicos necessários a análises anuais e parciais do desempenho do empreendimento. Isto condicionará a aplicação oportuna dos ajustes técnicos e gerenciais, otimizando os resultados biológicos e econômicos que permitirão oferecer ao mercado produtos com elevada qualidade, com regularidade da oferta e preços competitivos.
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, a proposta apresentada a ASCCOPER busca consolidar o reconhecimento local e regional do produto e iniciar a caminhada para um reconhecimento nacional. Deverá ser o primeiro produto com Denominação de Origem no país. Essa caminhada, entretanto, demanda muito esforço para atingir algumas metas essenciais para a consecução dos objetivos buscados, consubstanciadas nos seguintes aspectos:
- melhoria da eficiência bio-econômica e da sustentabilidade das suas unidades produtivas, via elevação dos níveis de produtividade animal, redução dos custos de produção e adequação dos sistemas de produção às condicionantes naturais da região;
- melhoria da capacidade de adaptação dos seus sistemas de produção à economia de mercado, via ajuste da dinâmica da produção estacional às demandas do mercado, ajuste dos padrões de qualidade do produtos às especificidades dos mercados, direcionando a produção para uma perspectiva de qualidade;
- atendimento às demandas sociais, via promoção do desenvolvimento, preservando a paisagem rural e valorizando a cultura e o saber-fazer como instrumentos de reafirmação da identidade local.
Empreendimentos com esse enfoque, no Semi-Árido, poderiam abranger não apenas produtos caprinos de outras regiões (“cabrito do Moxotó””, “cabrito-mamão do Cabugí”, “queijo de cabra do Cariri”, etc.), mas, também, vários outros produtos (borregos, queijos de leite de vaca, produtos apícolas de abelhas com e sem ferrão, aves caipiras, frutas nativas, etc.), demandando, naturalmente, para seu sucesso, o estabelecimento de normas e serviços que regulamentem e facilitem a operacionalização do processo, o fortalecimento das associações de produtores, a estruturação de redes locais de apoio técnico, e, principalmente, um linha específica de crédito, mais adequada às circunstâncias sob as quais operam os produtores e à capacidade remuneratória de capital dessas atividades. Uma ação inicial por parte da pesquisa seria essencial para fundamentar um processo de identificação e espacialização das potenciais marcas de cabritos, borregos, queijos, méis e outros produtos, baseados em elementos de identidade coletiva e ativos e fatores diferenciais que, segundo Flores (2003), permitiriam desenvolver novos negócios relacionados com agregação de valor, aproveitando as tipicidades e os patrimônios culturais e sociais específicos tão abundantes no Semi-Árido.
É bastante procedente o alerta de Altmann (2006) de que a simples aplicação de um selo de garantia de qualidade por si só não assegura a colocação dos produtos no mercado em condições vantajosas. O produto e seu sistema têm que ser plenamente conhecidos e respeitados por produtores, processadores e distribuidores e, sobretudo, reconhecido pelos consumidores, o que exige, também, concomitantes investimentos em marketing.
Concebido e operado dessa maneira, tais empreendimentos permitiriam a obtenção de resultados efetivamente impactantes na melhoria nos processos de utilização dos recursos naturais de solo, água, planta e animal do bioma caatinga e de gestão do espaço rural como um todo, na maior valorização da cultura e do saber-fazer locais e no melhor ordenamento e equilíbrio no processo de integração econômica e social entre as distintas condições agroecológicas e sócio-econômicas existentes nessa região.
11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTMANN, R. Certificação de qualidade e origem e desenvolvimento rural. In: VALORIZAÇÃO DE PRODUTOS COM DIFERENCIAL DE QUALIDADE E IDENTIDADE: INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS E CERTIFICAÇÕES PARA COMPETITIVIDADE NOS NEGÓCIOS. Organizado por Vinicius Lages, Lea Lagares e Christiano Lima Braga. Brasília: Sebrae, 2005. p.133-140
FLORES, M.X. Projeto de fortalecimento das capacidades competitivas dos pequenos produtores rurais: desenvolvimento territorial e estratégias inovadoras. Brasília: EMBRAPA-CONTAG-Fundação Lyndolpho Silva-SEBRAE-BID, 2003. 46 p (documento de trabalho não publicado)
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Figura 2. Modelo de Integração
Figura 1. Área delimitada para produção do cabrito ecológico do Vale
(1) Médico-Veterinário, M.Sc. em Produção Animal, consultor da Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos de Petrolina e Região – ASCCOPER, Pernambuco e da Cooperativa Agro-Industrial do Semi-Árido – COGRISA, Bahia. E-mail: clovisgf@uol.com.br
(2) Engenheiro-Agrônomo, Doutor em Produção Animal, pesquisador da Embrapa Semi-Árido. E-mail: jmoreira@cpatsa.embrapa.br
(3) Médico-Veterinário, Mestre em Reprodução Animal, pesquisador da Embrapa Caprinos. E-mail: daniel@cpatsa.embrapa.br