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 Planeta Orgânico entrevistou Fabio Ramos, diretor da empresa de consultoria agropecuária e agroindustrial Agrosuisse Ltda. Confira a opinião de Fabio Ramos sobre a situação atual do mercado orgânico no Brasil e as perspectivas para o futuro. 

PO: Quais as possibilidades de investimento no Brasil dentro do Setor Orgânico?

O Brasil despontou como o maior exportador de alimentos do mundo nos últimos 4 anos em vários setores. A cadeia de produção de alimento convencional no Brasil tem alguns setores que mostram viabilidade técnica e econômica. credito que a cadeia de alimentos orgânicos pode ter sucesso, principalmente frente ao mercado externo; o indicativo é a viabilidade de alguns setores da cadeia convencional de alimentos. Exemplos: a cadeia da carne onde temos uma tecnologia de produção avançada e temos também  todo o conhecimento de processamento e embalagens.

A cadeia da carne é um bom exemplo devido á viabilidade que mostrou nos últimos 3 anos quando o Brasil passou a ser o maior exportador de carne do mundo. Com a criação de redes e alianças mercadológicas e da produção, o Brasil desenvolveu um know-how na parte mercadológica de comercialização da carne, seja no mercado interno como no mercado externo. Não falo somente em quantidade, falo principalmente em qualidade. A carne brasileira  aumenta vendas no mercado externo a medida que tem uma relação direta com a capacidade tecnológica que o país oferece. Hoje a cadeia da carne é viável como produção, processamento e comercialização.

O desenvolvimento da cadeia da carne orgânica pode ser feito no Brasil com adequações tecnológicas muito próximas da tecnologia da carne convencional, devido á possibilidade de produção, pastagens e manejo de gado de maneira natural. O Brasil pode se transformar também no maior exportador de carne orgânica do mundo. Essa rede de produção de carne orgânica no Brasil ainda está no início. A demanda do mercado externo é muito maior do que a oferta mundial.  A Argentina, Austrália, Uruguai, que seriam grandes exportadores de carne orgânica, não vão conseguir atender a demanda da Europa de carne orgânica. Este é um exemplo, é uma oportunidade para o Brasil.

PO:  Como vai o Brasil na cadeia de frutas?

O Brasil, é um dos maiores produtores de frutas do mundo. Porém ainda não ocupa uma posição de destaque proporcional a esta produção. Como exemplo do Chile que tem uma dimensão menor que o Brasil e exporta mais frutas do que nós. Algumas frutas, como as frutas tropicais, já desenvolveram um sistema de produção orgânica e apresentam viabilidade técnica. A viabilidade econômica esta ligada ao desenvolvimento do mercado de frutas orgânicas, ainda muito incipiente.

O mercado de frutas é relacionado com a garantia e segurança ao comprador desse alimento, e conseqüentemente fazer com que o consumidor europeu sinta certeza que está consumindo um produto brasileiro com segurança alimentar. Tem que lembrar, que no final desta cadeia esta um consumidor exigente e bem informado. O comprador vai buscar o que o consumidor quer. A segurança alimentar e qualidade do alimento são fundamentais para o consumidor.

PO:  Que iniciativas o governo deveria tomar para promover um salto na imagem e na qualidade do nosso produto orgânico?  

A regulamentação da lei permitirá ao Brasil ocupar uma posição de destaque no cenário internacional do universo orgânico, assim como já ocupa nos alimentos convencionais.

Temos um posicionamento importante do Ministério da Agricultura. Criou-se uma Coordenadoria de Agroecologia que deverá ganhar espaço e ocupar uma posição estratégica para elaboração dos Planos Pluri-Anuais e Orçamentos Anuais e com isso garantir ao mercado externo uma política efetiva no Ministério da Agricultura. Com isso os compradores teriam maior segurança numa conversa com o mercado brasileiro.

No Ministério do Desenvolvimento Agrário o trabalho está sendo feito o fomento da agroecologia e da agricultura orgânica onde prevalece a pequena e média agricultura familiar. O Brasil deve dar continuidade a este processo de montagem destas redes e todo o apoio no processo de certificação, habilitando estes pequenos produtores e a agricultura familiar a tornar o seu produto competitivo e colocar estes produtos nos canais de comercialização.

Por último, o Ministério do Meio Ambiente colocar dentro da pauta do Ministério o desenvolvimento da agroecologia como fator estratégico de obter a missão maior do Ministério do Meio Ambiente que é a preservação dos recursos naturais do nosso país através de respeito a legislação ambiental.

A Agroecologia (agricultura orgânica) é um grande aliado do Ministério do Meio Ambiente, por tanto acho que este Ministério deveria se posicionar como o Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário tendo a agroecologia como fator estratégico dentro dele, já que a agroecologia através de suas normas têm a missão direta da preservação do meio ambiente.

A Ministra Marina Silva, sabe disso é só uma questão de posicionamento neste ano de 2006 para incorporar definitivamente, todo este desenvolvimento de serviços ambientais à agroecologia como instrumento estratégico.

PO:  Como você vê o crescimento do  Brasil orgânico?

Há 5 anos atrás no Brasil não tínhamos condições de falar que tínhamos 100.000 hectares de área orgânica. Possivelmente muito abaixo disso. Há 3 anos nós já tínhamos uma indicação que o Brasil já alcançara 800.000 hectares. Com este número o Brasil passa a se colocar como destaque no cenário mundial, já que o maior país em área orgânica, a Austrália, já apontava números que chegava a 8 milhões de hectares. No entanto, nos últimos 2 anos, o Brasil alcançou, através do senso realizado pelo Ministério da Agricultura em convênio com o Ministério do Desenvolvimento Agrário o número de 6.500.000 milhões hectares.

Esse número indica claramente o que está acontecendo no campo. Quem conhece o interior do Brasil sabe que nós temos uma certa mudança na estrutura agrária e agrícola e este número indica isto. O Brasil hoje, detém através do senso do Ministério da Agricultura 12.600 produtores rurais já certificados. Dentro destes 12.600,  podemos extrapolar isto até 50.000 unidades porque estamos contando com algumas associações e cooperativas. O Brasil, com estes dois números, passa a se tornar o 2º maior país em área orgânica do mundo, ultrapassando a Argentina que anteriormente era o 2º maior país e coloca o Brasil então, como o objeto de desejo destes investidores europeus que vêem que o crescimento de orgânico no Brasil tem taxas acima da média mundial.

Quando a gente sabe que o crescimento da área orgânica na Europa fica em torno de 10 a 15% e que a participação de alimento orgânico nestes  mercados totais de alimentos não ultrapassam a 2% ou 2,5 % e que a gente vê que o Brasil já tem uma taxa de crescimento em área orgânica de 40 a 50% e consegue atingir até 1% na participação do   alimento orgânico, vemos que em 5 anos o Brasil tem taxas muito superiores as taxas da Europa que são taxas que estão se apresentando nos últimos 10 anos. Então o Brasil tem o arcabouço de crescimento muito mais favorável do que a Europa ou os EUA. Comparativamente, acho que somente a Ásia tem este potencial brasileiro de crescimento dentro do mercado orgânico.

PO: Estaremos realizando um Seminário APEX durante a BioFach América Latina 2006 com o tema “Oportunidades de investimento no Brasil Orgânico”. O que você diria ao investidor sobre as oportunidades que oferecemos?

Eu diria que o Brasil é um país de oportunidades e que nestes 5 últimos anos se profissionalizou e assumiu definitivamente a sua posição de grande produtor de alimentos. O Brasil detém uma tecnologia de produzir alimentos de forma segura, natural e orgânica, que vai atender ao consumidor do mercado externo com um  produto de qualidade com alto valor nutricional e valor biológico. As oportunidades financeiras de investimentos no Brasil são inúmeras, devido até termos ainda um estoque de 90 milhões de hectares de terras disponíveis para o desenvolvimento agropecuário e agroindustrial desse país. Outro atrativo seria a questão da agroindústria brasileira que foi, sem dúvida nenhuma, o setor que apresentou um profissionalismo fundamental e que sustenta a posição do Brasil como grande exportador de alimentos no mundo, não só com carne bovina, carne de aves que o Brasil é o 1º exportador no mundo, como também na questão das frutas que o Brasil exporta uma fruta de altíssima qualidade.

De grãos o Brasil também é o maior exportador do mundo. Daí vemos que o cenário de oportunidades é muito grande. O Brasil apresenta não somente oportunidade na compra de terra mais também oportunidade no setor agro-industrial.

Diversas agro-indústrias precisam investimentos para fazer exatamente a parte de mercado externo. O investimento não é muito dentro da área de produção e de processamento. O investimento é na parte de logística e distribuição, o que seria de grande atrativo para investidores que acham nesta área de mercado, seja na Europa, nos Estados Unidos e mesmo na Ásia.

PO:  O Brasil cresceu  em hectares orgânicos certificados devido ao extrativismo?
Como você vê este salto?

Acho que o Brasil desenvolve a tecnologia de agroecologia há muitos anos. A ciência agroecológica é a mãe da agricultura orgânica. Na região norte do Brasil onde temos 5.500 milhões de hectares em sistema de manejo agroecológico, vem de um trabalho que é uma luta histórica no Brasil. No estado do Acre por exemplo, toda a luta do Chico Mendes na questão do extrativismo da seringueira no estado de Rondônia, toda a tecnologia de produção é agroecológica. Acredito que a produção agroecológica é mais do que  produção orgânica. Com toda segurança estas áreas são certificadas por organismos internacionais. Então quando vemos uma FSC certificando madeira brasileira, borracha brasileira, plantas da Amazônia, frutas da Amazônia dentro de uma exigência de normatização da União Européia, não podemos ter dúvida que essa área de produção agroecológica, esses produtos gerados dentro desse processo, auditados por organismos internacionais não estejam totalmente adequados a normatizações da agricultura orgânica.

A velocidade de certificação de um projeto agroecológico para a agricultura orgânica é muito rápida, porque a tecnologia utilizada já está totalmente dentro dos princípios da agricultura orgânica. Eu não questionaria isto. Eu questionaria porque este Senso não ampliou a sua atuação e não detectou outras áreas da região Nordeste, como por exemplo, onde temos uma agricultura que está sendo feita que é uma agricultura biodinâmica. São áreas que não estão computadas dentro desses 6.500 milhões de hectares. Estas áreas hoje estão sob manejo de um produtor do semi-árido. São áreas distantes, e não configuram muitas vezes, objeto de mercado externo. Então, você ainda não tem o arcabouço dessa cadeia de alimento como é o caso deste exemplo que estou citando do Nordeste. Este produto proveniente muitas vezes de sistema agroecológico biodinâmico naturais do Nordeste, não estão incorporados na cadeia mercadológica do alimento. Como a logística deste produto é mais difícil, este produtor precisa de um apoio maior. O segmento agroindustrial não está pronto na região Nordeste. Temos que profissionalizar e conseguir fazer um acabamento para dar a este produto do Nordeste o mesmo padrão tecnológico, a qualidade e a segurança que o produto da região Sul e Sudeste oferece ao consumidor externo.

Eu diria que o Brasil está com uma área em sistema agroecológico maior que 6.500 milhões. Cabe realmente a oficialização destes dados, o endosso do Ministério da Agricultura e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e a participação das certificadoras que atuam em nosso país para que possamos chegar a números corretos e seguros. Não tenho dúvida, no próximo anuário da FIBL, entidade suíça de pesquisa e fomento da agricultura orgânica no mundo, vai apresentar que o Brasil desponta de 6.500 milhões de hectares e certamente no ano que vem poderemos estar publicando dados que mostrassem uma real posição do Brasil. A regulamentação da lei vai ajudar muito nisso, porque os dados terão que estar centralizados no Ministério para que possamos ter a certeza de quantos hectares  temos e quantos produtores há no sistema agroecológico/orgânico no Brasil.

PO:  Pode-se então dizer que é uma boa opção para investir no Brasil orgânico?

Com a regulamentação da lei, que representa as regras do jogo, o Brasil vai dar segurança a novos investimentos no setor dos alimentos orgânicos. Além diso com toda a revolução que esta havendo no campo, onde temos diversos produtores rurais, grandes, médios e pequenos, voltando seus sistemas de produção para a agroecológia e agricultura orgânica, o Brasil vai ser um atrativo cada vez maior para estes investimentos. Quem conhece o interior do Brasil esta percebendo a transformação que vem ocorrendo em diversas regiões. Estas transformações representam uma mudança no paradigma de produzir alimento e ofertar ao mercado, fato que esta cada vez mais evidente no mercado internacional. As possibilidades de investimentos na cadeia dos alimentos orgânicos no Brasil são inúmeras, da produção de insumos até a comercialização de alimentos em diversos segmentos de mercado. O Brasil é  um grande produtor de alimentos e vem se firmando como um produtor de alimentos de qualidade, fator fundamental para atender os mercados compradores.

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Fabio Ramos é autor do livro
“Alimentos Orgânicos: Produção & Consumo”
framos@agrosuisse.com.br