Estiagem recorde em São Paulo em 2014 teve mesma raiz que enchentes em Rondônia, mostram pesquisadores do Cemaden e do Inpe. Prejuízo no ano foi de US$ 5 bilhões

Uma radiografia completa da estiagem que secou o Sistema Cantareira e levou a maior cidade da América do Sul ao racionamento de água foi publicada no fim do mês passado por um grupo de cientistas de duas instituições de pesquisa federais.

No trabalho, o grupo liderado por José Marengo, do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) mostra que a seca paulista de 2014, em seu conjunto, é um fenômeno sem precedentes. E está diretamente relacionada a outro desastre natural que atingiu o país naquele ano: as enchentes em Rondônia e no Acre, que isolaram a região e causaram prejuízos na casa dos R$ 200 milhões aos acreanos ao cortarem a única ligação terrestre do Estado com o resto do Brasil, a BR-364.

Segundo Marengo e colegas do Cemaden e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a bolha gigante de ar quente que ficou um mês e meio estacionada sobre o Sudeste do Brasil teve um efeito colateral: ela bloqueou as correntes de ar úmido que vêm da Amazônia para o Sudeste, os chamados jatos de baixos níveis.

 

Reduzir o desmatamento e recuperar florestas são, provavelmente, uma boa ideia para aumentar a resiliência do país à seca.

Essas massas de ar, que ganharam o nome popular de “rios voadores”, ajudam a trazer chuva para São Paulo, Minas Gerais e parte do Centro-Oeste. Porém, em 2014, elas foram barradas pela região de alta pressão (ou seja, uma massa de ar mais próxima da superfície) formada no Sudeste e Centro-Oeste, o que desviou as chuvas para Rondônia.

Outra parte do jato bloqueado foi bater no Rio Grande do Sul, que também teve chuva acima da média naquele ano.

A observação não chega a ser um endosso da hipótese de que o desmatamento na Amazônia é um dos fatores por trás da falta d’água em São Paulo, que ganhou popularidade na época. Segundo o grupo, com os dados disponíveis não é possível fazer relação direta entre o desmatamento da Amazônia e a falta d’água em São Paulo.

“São necessários estudos com modelos climáticos globais complexos, nos quais se simule o clima com vários níveis de concentração de gases-estufa e de mudanças no uso da terra, por exemplo, urbanização ou desmatamento da Amazônia, para detectar impactos no transporte de umidade fora da bacia amazônica e nas chuvas nas bacias no Sul e Sudeste do Brasil”, escreveram os cientistas.

No entanto, eles também dizem que, mesmo diante da incerteza, reduzir o desmatamento e recuperar florestas são, provavelmente, uma boa ideia para aumentar a resiliência do país à seca.

“Considerando a complexidade das relações entre floresta e chuva nas regiões ao leste dos Andes, uma possível solução para não alterar o ciclo hidrológico da Amazônia seria reduzir o desmatamento e reflorestar áreas em várias regiões do Brasil”.

Assista ao vídeo e saiba mais sobre os “rios voadores”:

Fonte: Claudio Angelo/ Observatório do Clima
Foto destaque: Nelson Antoine/Fotoarena/Estadão Conteúdo

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