(*) Ana Flávia Borges Badue

Dando continuidade à temática do Painel, foi realizado um Fórum que teve como objetivo apontar experiências de produtores e de prefeituras que apóiam o abastecimento de produtos agroecológicos na alimentação escolar.

Introduzindo as apresentações, ressaltamos a necessidade de se pensar estratégias que não só cuidem do suporte à produção e abastecimento, mas também do suporte à educação alimentar associada à educação ambiental, e da infra-estrutura e envolvimento de todos os integrantes da escola. Consideramos que o ideal seria que tudo isso ocorresse com uma gestão e articulação inter-setorial, e planejamento participativo envolvendo os diversos representantes da comunidade escolar e dos setores envolvidos. Como exemplo de política pública municipal de educação alimentar e nutricional foi apresentada a experiência do município de Jundiaí (SP)

Programa de Jundiaí (SP) de Alimentação Escolar 

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A Nutricionista Adriana Cristina Barbosa da Diretoria de Alimentação e Nutrição de Jundiaí (SP),  as auxiliares de serviços educacionais, Maria Zuleide Lacerda e Joana Cuestas e o engenheiro agrônomo Hamilton  Bernussi, todos da Secretaria Municipal de Educação, mostraram a amplitude do programa de Alimentação Escolar do município de Jundiaí (SP)

Uma política pública que vem implementando ações integradas e estruturadas num Sistema de Gestão da Qualidade da Alimentação e Nutrição (desde 2002) e no Sistema Informatizado de Alimentação e Nutrição Escolar (criado em 1999 este sistema on line  permite a integração de cada escola, ao almoxarifado central da Merenda e à Diretoria de Alimentação Escolar). As merendeiras passaram a ser reconhecidas por lei municipal como Auxiliares de Serviços Educacionais, uma atribuição inédita no país.

Estas profissionais, segundo Barbosa, passam por Capacitações mensais (de temas diversos: técnicas  e cuidados com os alimentos, informáticas, relações humanas, matemática, ergonomia, reeducação alimentar, gestão da qualidade da alimentação escolar, proposta pedagógica, e orientações específicas em cada escola). Elas são fundamentais na educação alimentar na escola e integram, juntamente com os professores e demais educadores da escola, os Programas:

vistoSaúde no Prato (início em 2000): programa de educação nutricional, para estimular novas perspectivas alimentares, conceitos de saúde e higiene e hábitos alimentares saudáveis, através de agentes multiplicadores promotores de saúde. Anualmente há a socialização das experiências das diversas escolas no Seminário dos programas Saúde no Prato e Horta Escolar, e por meio do livro de receitas  preparadas nas escolas; 

vistoHorta Escolar (desde 1996): inserido na proposta pedagógica construtivista, com base na filosofia da agricultura orgânica, proporciona a oportunidade de conhecer o cultivo de diversas hortaliças e sua utilização na culinária. Integrado ao programa Saúde no Prato, este programa permite trabalhar a aceitabilidade da diversidade de hortaliças, o que para consumo de hortaliças orgânicas é fundamental.  O programa recebe apoio de alguns órgãos municipais, da Casa da Agricultura do Estado de SP e da comunidade vizinha a cada escola.   

vistoSelf-service (desde 1993): Num contexto de educação alimentar como um processo pedagógico, este trabalho iniciado na Educação Infantil “prepara a criança para a apropriação de forma autônoma de habilidades relacionadas à alimentação e  construção de um referencial de preferências, com qualidade”, além de conscientizar as crianças para evitarem desperdícios, sobre a quantidade ideal de alimentos, entre  outras estratégias educativas.

vistoColeta Seletiva: complementa as ações de consumo responsável nas escolas.  

Experiência da Cooperativa Ecocitrus

Para dar o exemplo de um grupo formal de agricultores que buscam o abastecimento da alimentação escolar, o presidente do Conselho Administrativo, Ernesto Carlos Kasper, fez uma breve exposição sobre a atuação da Ecocitrus (Cooperativa dos Citricultores Ecológicos do Vale do Caí), que foi inicialmente formada como Associação em 1994, em Montenegro (RS), por 15 pequenos agricultores, com produção de frutas orgânicas. Hoje, 15 anos depois, a cooperativa conta com 110 associados. Destes, 7 são produtores trabalhadores, 42 são sócios trabalhadores, 10 são empregados e 61 agricultores. A Ecocitrus é um empreendimento de Economia Solidária cadastrado no Sistema Nacional de Economia Solidária (SIES).  A instituição tem uma área total de 600 hectares cultivados sendo destes 255 hectares de cítricos. A agroindústria de Sucos Cítricos e de Óleos Essenciais visa agregar renda ao citricultor por meio do processamento próprio de óleos e sucos cítricos, bem como de outros produtos, utilizando as frutas de raleio de bergamotas e os frutos cítricos maduros de menor qualidade para a extração de óleos e sucos. Em 2009, a projeção é de que a cooperativa processe em torno de 2,5 mil toneladas de frutas. O faturamento gira em torno de R$ 5 milhões por ano. Em 1995, para recuperar suas áreas, a cooperativa criou uma base de beneficiamento de adubos orgânicos, chamada de Usina de Compostagem de Resíduos Agroindustriais. A Usina de Compostagem de Resíduos Agroindustriais e a agroindústria da Ecocitrus são algumas das várias atrações da Rota Sabores e Saberes, de turismo do Vale do Caí, criada em setembro de 2007 na região.

Expositora na Biofach, a Ecocitrus tem uma linha de produtos ecológicos que recebe a certificação da Rede de Agroecologia Ecovida (Sistema Participativo de Garantia), também têm o selo de qualidade orgânica do IBD (Instituto Biodinâmico) e a Certificação internacional de comércio justo (Fairtrade certification) fornecida pela Fairtrade Labelling Organizations International (FLO). Kasper ressaltou a importância do programa de assistência técnica e formação permanente da cooperativa. No município de Montenegro, segundo ele, já estão sendo promovidas reuniões dos produtores com a Prefeitura sobre o abastecimento da alimentação escolar e o fato de já terem o PAA facilitará o processo. Para Kasper, o PAA possibilitou aos agricultores a diversificação de plantio nas propriedades, mas deve ser encarado, assim como o abastecimento da alimentação escolar, como um estímulo à organização dos agricultores, e não como um recurso permanente. Assim, nesse contexto, ele acredita que o abastecimento da alimentação escolar é uma alternativa que deve complementar outras modalidades de venda da agricultura familiar, para não se criar dependência em uma única modalidade de comercialização.          

Experiência da formação de Consórcio e Redes de Associações e Cooperativas para abastecimento da Alimentação Escolar no estado  de São Paulo

Essa Rede, que esta sendo mobilizada pela CATI- Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo) com apoio da Delegacia São Paulo do MDA- Ministério do Desenvolvimento Agrário,  da  UNESP de Botucatu e outros parceiros, têm se reunido para propiciar o apoio necessário  à constituição de Consórcios do Sistema Único de Atenção à Sanidade  Agropecuária – SUASA e de compra de produtos das organizações formais dos  agricultores familiares para a Alimentação Escolar  sem licitação, conforme  Lei Federal nº 11.947 de 16 de junho de 2009 do Fundo Nacional de  Desenvolvimento da Educação, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada  pelo Presidente da República. A rede das organizações formais se distribui em 5 regiões: Região Metropolitana de São Paulo, Vale do Paraíba, Noroeste Paulista, Sorocaba e  Centro Paulista visando  atender a demanda do mercado local e regional, através de uma melhor estruturação e de um planejamento da produção. A meta desta articulação é de se criar pelo menos 1 consórcio de municípios em  cada região para a viabilização do SUASA. 

Segundo Saraiva, articulador da rede, os principais desafios que os agricultores familiares vêm encontrando para abastecerem a alimentação  escolar são: falta de cultura de organização em associações e cooperativas, emissão de DAPs para agricultores (em especial aqueles que são da  Agricultura Urbana e Peiurbana. No caso da compra acima de 100 mil reais por ano os agricultores que irão abastecer a merenda deverão ter DAP jurídica, sendo este um grande desafio para sua organização); interação com os departamentos de compras; prática efetiva da agroecologia; acesso aos  insumos; apoio de infra-estrutura para a comercialização; e atendimento à legislação sanitária. Saraiva acredita que somente em articulação em rede os agricultores poderão se fortalecer e conseguir atender a logística e as  demandas do abastecimento escolar nas diversas regiões.

Reflexões sobre os desafios e sugestões 

Considerou-se que seria fundamental, que no cadastramento dos agricultores familiares que esta sendo feito pelo MDA no site criado especificamente sobre Alimentação Escolar, pudesse se distinguir aqueles que farão o abastecimento com produção orgânica/ agroecológica  daqueles que farão com  produção convencional. 

Políticas públicas de educação alimentar e infra-estrutura nas escolas, como a que é implementada em Jundiaí, foram consideradas  como referência para se pensar as ações do Centro de Referências em Educação  Alimentar que o FNDE pretende financiar, conforme previsto na  nova lei de alimentação escolar. Da mesma forma, foi colocado que há necessidade de uma maior articulação entre os diversos programas existentes, para não haver sobreposição de recursos e esforços. Assim, poderia se integrar os Centros de Referência em Segurança Alimentar e de Agricultura Urbana e Periurbana (MDS) aos Centros de Referências pretendidos pelo FNDE. Bem como, diante da necessidade de apoio técnico constante para a implementação das hortas escolares, poderia haver uma ampliação do programa federal “Educando com a Horta Escolar”, do FNDE, FAO e MEC, e um resgate de práticas de hortas perenes e de brotos do extinto projeto  Alimentação Sustentável e Hortas Perenes da Fundação Banco do Brasil (consultoria da Dra. Clara Brandão). Também é importante que os representantes das escolas, participem do CAE- Conselho de Alimentação Escolar de seu município e ali exerçam o controle social necessário para o acompanhamento e cobrança da qualidade do abastecimento da alimentação escolar.

Os diversos depoimentos apontam para a necessidade de uma estratégia de comunicação do governo federal mais contundente junto aos Departamentos de Alimentação Escolar e de Compras de estados e municípios, a fim de propiciar a superação de preconceitos em relação ao abastecimento direto da agricultura familiar para a  alimentação escolar.

Para os produtores, todos os presentes consideraram que é fundamental que se associem ou atuem em uma cooperativa, para darem conta da logística do abastecimento da alimentação escolar. Nesse contexto, as redes e consórcio de cooperativas e associações de produtores poderão ampliar  as articulações e  facilitar o  processo.

Por fim, considero que seria importante para a prática da Segurança Alimentar e Nutricional buscar incluir no abastecimento da alimentação escolar, de alguma forma, os agricultores Urbanos e Periurbanos, em especial aqueles das regiões metropolitanas. E também ter a participação efetiva das merendeiras (que poderiam ser auxiliares de serviços educacionais, como ocorre em Jundiaí) nos Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional (municipal, estadual e federal), além da participação das mesmas nos Conselhos de Alimentação Escolar.  

WORKSHOP GASTRONÔMICO

Claudia Mattos chef de cozinha

Claudia Mattos chef de cozinha

A chef de cozinha Claudia Mattos, mais uma vez participante da BIOFACH com o tema da alimentação escolar, convidou como assistentes da sua apresentação a merendeira/auxiliar de serviço geral da Escola Estadual Rev. Erodice (São Paulo), Valdice Morais, e as auxiliares de serviço educacional da Diretoria de Alimentação e Nutrição de Jundiaí (SP), Maria Zuleide Lacerda e Joana Cuesta.

O cardápio por ela sugerido foi: salada com plantas perenes (podendo acrescer brotos), hambúger de germinados ao molho vermelho, e escondidinho de casca de banana verde com mandioca, como prato principal. A chef buscou valorizar e demonstrar os benefícios do consumo dos brotos e plantas perenes que podem ser cultivados na horta escolar e da banana verde, considerando sua grande disponibilidade no país (o Brasil é o maior consumidor de banana do mundo), a alta qualidade nutricional (a presença do amido resistente na banana possibilita aumento de resistência física), e destacou a necessidade de evitar desperdício (atualmente 60% da banana é descartada).

Sua apresentação também trouxe diversas sugestões de utilização da biomassa da banana verde e o coração da banana verde para enriquecer o cardápio usual da alimentação escolar, com seu uso em suco, feijão, caldos, entre outros, bem como a utilização de frutas verdes como jaca (muqueca), mamão (salada) e manga (chutney).

Contatos Fórum Merenda Escolar BioFach América Latina/ExpoSustentat 2009

Programa de Jundiaí de Alimentação Escolar – Diretoria de Alimentação e Nutrição: nutricao_me@jundiai.sp.gov.br

Ecocitrus: Ernesto Carlos Kasper – www.ecocitrus.com.br

– Consórcio e Redes de Associações e Cooperativas para abastecimento da Alimentação escolar no estado de  São Paulo: Paulo Cesar Saraiva (CATI-SP) – paulo.saraiva@cati.sp.gov.br 

Workshop Gastronomia:   – Claudia Mattos – Zym Café:(11) 3021-5637/www.zym.com.br

(*) Ana Flávia Borges Badue
Graduada em Arquitetura e Urbanismo (FAU-UP), Mestre em Saúde Pública (FSP-USP), atua como educadora ambiental com foco em educação para o consumo responsável. É diretora do Instituto Kairós (www.institutokairos.net) e membro da Comissão Estadual da Produção Orgânica –  CePORg (SP). 

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Alimentação Escolar e o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA”


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