CONFIRA TEXTO DE CRISTIANA BELTRÃO, DIRETORA DE MARCA E QUALIDADE DO GRUPO BAZZAR, SOBRE VALORIZAÇÃO DE PRODUTOS LOCAIS. O GRUPO BAZZAR ESTEVE PRESENTE NO VERDE RIO 2014.
Cristiana Beltrão é Sócia-fundadora do Restaurante Bazzar, em 1998, hoje GRUPO BAZZAR, com fábrica no Rio de Janeiro que fornece molhos, coberturas, sobremesas e café para mais de 600 pontos de venda no Brasil e também para os EUA, França, Estônia e Finlândia.
Em 2012, Cristiana Beltrão foi eleita restauratrice do ano pela Veja Rio.
O GRUPO BAZZAR esteve presente no Rio Verde, prospectando novos produtos e fazendo contatos.
Durante encontro no Bazzar da Livraria da Travessa em Ipanema, o Planeta Orgânico conversou com Cristiana sobre gastronomia como formadora de opinião, valorização de produtos locais, regionais, respeito aos safras, entre outros. O texto de Cristiana, “Mudar as Estações, e nada mudou.”é um estímulo para produtores e atores envolvidos em alimentação saudável e sustentável. Confira!
Mudaram como Estações, e nada mudou…
Enquanto circulo pelo salão, clientes habituais se debruçam sobre os pratos, tentando constrangidamente escondê-los de mim. Com um olhar de quem estava roubando o biscoito, explica: “Eu tento, mas não consigo mudar! Já saio de casa sonhando com isso!”.
Quem não é do ramo, desconhece que esta é a regra, não a exceção. A menos que esteja em férias ou em ocasiões especiais, a maioria de nós buscamos a segurança naquilo que vem. E confesso que o fenômeno vem, igualmente, meu apetite: dos 365 dias do ano, só em uns 50 meu estômago desperta com espírito aventureiro. Nos demais, sonho com as deliciosas mesmices que cruzam meu caminho.
O lado perverso do “samba de um prato só” não está na falta de trilha original, mas na variável que desafina o ingrediente: a Estação.
Garanto que o leitor, em suas aventuras caseiras, elaborou exatamente a mesma receita ao longo do ano e atribuiu as dissonâncias unicamente aos seus tropeços como cozinheiro. Nem sempre. O fim da safra empalidece o ingrediente, desequilibra suas receitas e, de quebra, suas finanças.
Caminha, ao relatar que no Brasil “em se plantando, tudo dá”, omitiu a segunda parte: “dá… mas metade do ano está feio, seco ou azedo”. Tomate só fica bom lá pra dezembro, e por uns 3 meses, com sorte. Por puro capricho, queremosspaghetti ao sugo e salada de alface com tomate o ano inteiro, e forçamos a produção para a da safra.
A geografia, essa megera, também não perdoa. Em vez de adotarmos como frutas, leguminosas, e peixes nativos no nosso dia a dia, queremos aqui os pálidos exemplos daquilo que vimos na Europa. Lindos morangos aparafusam as mais variadas tortas de janeiro a dezembro, mas só conservam a doçura por dois meses no fim do Inverno, e ainda assim, nada comparáveis aos morangos de países frios. O resultado? Como versões congeladas abundam enquanto os bolsos afundam.
Nada contra as culturas não nativas que se tornaram espontâneas como banana, coco ou mangá, mas devíamos estar nos entupindo de sapucaias e caraguatás, genuinamente cariocas. Nunca ouviu falar? Pois é…
Houve um cliente que ameaçou fazer um banzé pela falta de um prato de camarões. Quando ensaiei argumentar sobre a entressafra, ele respondeu: “Vou várias vezes ao no Fulano de Tal (estrelado parisiense) e como camarões o ano inteiro!”. Esse, infelizmente, é um exemplo comum de consumidor equivocado, auto proclamado exigente.
Nunca me esqueci de um “prato do dia”, descrito na lousa, com ingredientes da estação que comi no Sul da França. Era uma massa com limões de Menton (os melhores) e manjericão colhido no ato. A preparação não poderia ser mais simples ou barata, mas no auge da safra os ingredientes estouravam na boca como adolescentes, vibrantes e em seu ápice, e fez de um “bobagem” um prato inesquecível.
Somos um país de dimensões continentais, com cultura da abundância e hábitos errados enraizados no nosso dia a dia. Pelo bem do seu estômago, seu bolso e sua boca, em sua próxima aventura gastronômica, prefira os produtos da vez. Eu garanto: por mais curioso que possa lhe parecer, você ainda vai se se por um in apaixonarhame.
